Tropicália — Bananas ao vento: a música tropicalista como retrato de uma modernidade interrompida. [Capítulo 1 - Colocando o pingo nos ismos]
[Atenção! Este texto é parte do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado em 2020 para minha graduação em História pela UERJ. Para conferir o resto acesse os links disponíveis no fim da página]
Este capítulo visa aferir alguns dos conceitos que permeiam os debates acerca da Tropicália. Dentre tantos elementos mobilizados pelos artistas e seus posteriores analistas, julgo que o nacionalismo, o modernismo, o populismo e o próprio tropicalismo merecem uma atenção especial neste trabalho. O foco nas nacionalidades e modernidades em disputa, expressas nas músicas tropicalistas, demandam uma análise dos “-ismos” que residem por trás dos “-dades”. De tal forma, começamos pelo nacionalismo e posteriormente pelo modernismo. Do encontro destes dois elementos, especialmente na conjuntura brasileira dos anos de 1960, emergem outros dois conceitos que passaram por análise. No campo da cultura política, o populismo ganha a condição de “espantalho”. Inúmeros trabalhos sobre a Tropicália referem-se ao conceito sem se darem ao trabalho de ao menos defini-lo. Esta é uma tarefa necessária, uma vez que a crítica ao “populismo”, principalmente a partir do filme Terra em Transe (1967), se transformou em um fio condutor entre os cânones tropicalistas. São esses, Hélio Oiticica, Gláuber Rocha, José Celso Martinez e Caetano Veloso. A influência destes 4 artistas, em seus respectivos campos, foi o que ficou caracterizado pela crítica e pela historiografia como “tropicalismo”. Ao fim deste capítulo trarei uma distinção entre tropicalismo e Tropicália, que acredito ser adequada para apartar o trabalho específico de um grupo de artistas de uma espécie de rótulo criado pela imprensa. A devida caracterização destes quatro conceitos será fundamental para a análise da obra presente neste trabalho, e espero que auxilie uma posterior revisão da historiografia sobre o tema por outros pares.
1.1 Nacionalismo
O que é o nacionalismo? Qual o seu papel histórico na fundação de Estados-Nação? Como se combinam diferentes manifestações culturais sob o mesmo signo nacional? E o que esses conceitos significam para a periferia capitalista, especialmente o Brasil? Partindo da compreensão de que a nacionalidade se manifesta como um ‘artefato cultural’ resultado “do cruzamento complexo de forças históricas”, Benedict Anderson propôs-se questionar como esse artefato tornou-se uma entidade histórica, a transformação de seus significados no tempo e como “inspiram uma legitimidade tão profunda” (1) . Sob uma perspectiva antropológica, Anderson entende que o nacionalismo tem uma forte relação com conceitos ligados à família e à religião. Conclui que nações são ‘comunidades imaginadas’; distintas não como propôs Ernest Gellner, entre “autênticas” ou “falsificadas”; mas por estilos de imaginação (2) . Imaginadas, porém, de forma limitada: por fronteiras e pela alteridade. Imaginadas como soberanas — após a devassa do direito divino promovida pelo Iluminismo, a legitimidade depende da vontade dos associados à “fé” nacional, do povo. Por fim, imaginadas como comunidade: a nação é sempre concebida como um companheirismo profundo e horizontal; fraternidade que possibilita que milhões de pessoas, não só matem, mas morram voluntariamente. Partindo da chave analítica oferecida por Anderson, o sociólogo Stuart Hall reformula sua questão: Como é imaginada a nação moderna? Que estratégias de representação constroem o sentimento comum de pertencimento e identidade nacional? (3) .
Hall elenca cinco elementos principais:
- A narrativa da nação: Como são contados e recontados seu passado, sejam eles históricos ou mitológicos; temas e cenários comuns na historiografia, na literatura, mídias e no imaginário popular.
- A tradição atemporal: elementos essenciais do caráter nacional; imutáveis, unificados e contínuos.
- A tradição inventada: a reformulação de práticas, rituais e simbologias que busquem introduzir novas normas e valores.
- O mito fundador: ou, a História vista de cima.
- O mito popular/folclórico: ou, a História vista de baixo.
O sociólogo jamaicano entende o nacionalismo como um equilíbrio entre glórias passadas e um impulso por avançar em direção à modernidade. Uma conexão ideológica entre passado, presente e futuro; História e memória motivando o desejo de pertencer à comunidade e perpetuar sua herança. Esses cinco elementos coincidem com os critérios oferecidos por Eric Hobsbawm para a associação de indivíduos enquanto nação e sua decisão de formar um Estado baseado nesse conceito. O primeiro critério é o da história institucional-cultural dos letrados; ou seja, as histórias das elites. Nelas os povos restauram suas tradições mais remotas e encontram (ou fabricam) algo que lhes dê um mínimo de coesão e coerência. Sejam os antigos Estados-nação, os antigos reinos ou mesmo os antigos Impérios (4) . O segundo critério é o princípio de alteridade que operava na lógica de antítese; se os Estados aristocráticos se afirmavam na haute culture, as identidades regionais se afirmaram na cultura do folk, do povo. No entanto, esse folclore não é político em si. Hobsbawm aponta que “onde não havia argumentos históricos para a unificação (…) esta era, quando possível, formulada como um programa” (5) . O nacionalismo operou também como uma ideologia, que no séc. XIX conseguiu ocupar as lacunas deixadas pelos programas de cunho revolucionário e os de ordem conservadora. Em muitas ocasiões essa ideologia foi disseminada de cima para baixo; pela iniciativa de um líder aristocrata ou mesmo de um Rei, como na Alemanha e na Itália (6) ; outras por iniciativas burguesas como na Tchecoslováquia. Esses processos contaram com “vanguardas nacionalistas” que militavam e faziam circular os ideais fundadores de suas nações. Hobsbawm atenta para a presença de um estrato social intermediário entre as massas e a burguesia como agentes dessa militância. Por fim viria a adesão dos trabalhadores e camponeses que, segundo o autor, evitavam pisar fora do “caminho traçado pela elite (7)”.
Eric Hobsbawm afirma que, pela necessidade de construir uma nação, impõe-se o papel crucial das instituições de Estado para organizar as forças produtivas e oferecer, através de superestruturas como o sistema educacional, meios de expandir a cultura nacional. Lord Acton escreveu, já em 1862, que no absolutismo europeu, “os direitos das nacionalidades não eram reconhecidos pelos governos nem afirmados pelos povos” (8) . A nacionalidade não era uma questão tangenciada pela luta em prol da liberdade; os absolutistas se importavam com o Estado; os liberais com o indivíduo; Igreja e nobreza com a dinastia. A política girava em torno desses temas, e conceitos como ‘nacionalidade’ ou ‘independência’ jamais eram contemplados. O autor relata que o nacionalismo não se tornou apenas um auxiliar revolucionário, mas “sua substância mais efetiva”. Na Revolução francesa a nacionalidade atuou como fator aglutinador de um povo que havia conquistado a própria soberania (9) . A ideia da soberania do povo não controlada pelo passado deu origem à ideia de nacionalidade. Ela brotou da rejeição de duas autoridades: o Estado e o passado (10) . Retornando a Stuart Hall, o autor conduz três observações que funcionam como balizas para o desenvolvimento das culturas nacionais: A violência como signo de muitas das unificações nacionais; a nação enquanto composição de diferentes classes sociais, grupos étnicos e de gênero; por fim, a dinâmica de dependência perpetrada pelo sistema colonial e neocolonial que criou hegemonias culturais que subjugam culturas periféricas.
Em 2000, Partha Chatterjee afirmava que após a URSS o ressurgimento do nacionalismo passou a ser uma ameaça à pax liberal. O autor denuncia a disciplina ideológica imposta aos Estados pós-coloniais, em que “desenvolvimento e modernização” transformaram-se em antagonistas do nacionalismo periférico (11) . Podemos notar na América Latina uma associação do nacionalismo às ditaduras militares do século XX, especialmente no Brasil na forma da Doutrina de Segurança Nacional, Essa associação causou prejuízos ao nacionalismo enquanto conceito político, que foi entendido como uma ideologia “autoritária”. Líderes anticoloniais e anti-imperialistas que não tiveram sua reputação difamada — como Fidel Castro ou Hugo Chávez — ou caíram no ostracismo — o caso de Patrice Lumumba e Thomas Sankara — ou tiveram suas imagens apropriadas às questões vazias. Como nota Chatterjee, Gandhi virou um símbolo do pacifismo e vegetarianismo, Ho Chi Minh foi apropriado pela Guerra Fria, Nelson Mandela se tornou o campeão da harmonia racial e Ernesto Guevara se transformou em um ícone de rebeldia genérica. Os princípios nacionalistas de independência, soberania e autodeterminação, e suas manifestações na periferia capitalista foram amplamente rejeitadas e denunciadas pela metrópole capitalista (12) . Nesse contexto hostil ao nacionalismo, Chatterjee cita o êxito de Benedict Anderson em trazer argumentos relevantes ao debate. No entanto, aponta que seus limites estão nas “formas modulares” que estruturam um Estado-Nação na periferia mundial. Em outras palavras: se o formato e a organização de um Estado moderno é imposto por uma lógica de eficiências e prioridades orientadas pela ordem capitalista internacional, “o que lhes resta para imaginar?” (13) .
Se criar um Estado-Nação fosse como pintar um quadro, o que foi dado para as periferias foram três cores de giz de cera e um livro de colorir velho. Como sugere o autor, é fundamental entender o que constitui a identidade de cada nação para além da hegemonia colonial (14) . No caso brasileiro nos deparamos com uma enorme dificuldade de saber quem somos. Diferente da Índia, da China ou mesmo das nações andinas e mezo-americanas, o Brasil não possui um passado milenar. A despeito do honroso esforço desprendido por vários historiadores em resgatar as memórias indígenas, a “inconveniência histórica” da colonização pegou os povos nativos em um estágio de desenvolvimento que não os permitiu erguer monumentos materiais e imateriais que formulassem uma larga tradição. Em outras palavras: não possuímos um Chichén Itzá ou as pirâmides de Teotihuacán, capazes de marcar o imaginário nacional enquanto monumento pré-colonial (15) . Então o Brasil está aí, beirando os 200 anos e ainda sem muito bem saber quem é; desde a fundação do IHGB os debates sobre as “raízes do Brasil” não cessam. Como dizia Darcy Ribeiro: Filho do índio, do negro, do branco; não é branco, não é negro e nem é índio. É um ninguém, um “filho da terra” (16) .
Em O Povo Brasileiro (1995), Darcy Ribeiro encontra no dilema dos primeiros “brasilíndios” a origem da identidade brasileira. Também chamados de ‘mamelucos’, esses primeiros brasileiros eram majoritariamente filhos de pais europeus e mães nativas. Buscavam identificação com os pais, porém estes os viam apenas como bastardos, filhos da terra. Úteis apenas para trabalhar enquanto jovens e servir nas bandeiras quando estivessem mais velhos. Se voltassem para suas mães, teriam uma segunda rejeição. Segundo o autor, para os povos nativos quem nascia era filho do pai, não da mãe. Portanto, eram estrangeiros em meio à família materna. Diz Darcy Ribeiro, que “não podendo identificar-se com uns nem com outros de seus ancestrais (…) o mameluco caía numa terra de ninguém, a partir da qual constrói sua identidade de brasileiro” (17) . É sob esta condição de deslocado, e com o influxo das culturas africanas introduzidas por meio da escravidão, que se ergue a língua, a tecnologia, a cultura e a cosmovisão brasileiras. Uma interpretação superficial dos argumentos de Darcy Ribeiro pode levar a crer que o autor tentava resgatar a ideia da “democracia racial”. Entretanto, uma leitura atenta perceberá a centralidade que a luta de classes possui na obra. A todo momento o autor imputa nas classes dirigentes a responsabilidade pelo subdesenvolvimento da nação, material e espiritualmente. Parte das classes dirigentes, em diversos momentos da História, a vã tentativa de “europeizar” a identidade brasileira. Como fazer de uma feitoria destinada a produzir itens exóticos, orientada pela exportação, fundamentada no latifúndio, movida pela escravidão, algo diferente desta anomalia que a define? Para Darcy Ribeiro, isto é impossível.
“A mais terrível de nossas heranças é esta de levar sempre conosco a cicatriz de torturador impressa na alma e pronta a explodir na brutalidade racista e classista. Ela é que incandesce, ainda hoje, em tanta autoridade brasileira predisposta a torturar, seviciar e machucar os pobres que lhes caem às mãos. Ela, porém, provocando crescente indignação, nos dará forças amanhã, para conter os possessos e criar aqui uma sociedade solidária” (18) .
Darcy dedica parte importante da sua obra à contribuição fundamental dos povos negros introduzidos à força em nossa cultura. Em confronto direito com os trabalhos de Gilberto Freyre, Ribeiro é claro ao afirmar que “a própria expectativa de que o negro desapareça pela mestiçagem é um racismo”. Entretanto, a aposta feita na mestiçagem parece não ter considerado que esta seria uma via de mão dupla. Por um lado, afirma Darcy Ribeiro, o “aspecto mais perverso do racismo assimilacionista é que ele dá de si uma imagem de maior sociabilidade”, permitindo uma “atmosfera de fluidez nas relações inter-raciais”. É por meio desta fluidez que se elevam figuras como Pixinguinha, Pelé e Grande Otelo (19) . Por outro, essa fluidez “desarma o negro para lutar contra a pobreza que lhe é imposta” e “dissuade o negro para sua luta específica, sem compreender que a vitória só é alcançável pela revolução social” (20) . Portanto, Darcy entende que, reside na organização da sociedade e suas forças produtivas os obstáculos para as diferentes etnias que compõem a nacionalidade brasileira. Entre esses obstáculos postos pela classe dirigente, está o embranquecimento da sociedade — na pele ou na alma. A despeito deste racismo superar seu mero caráter ideológico, e se manifestar inúmeras vezes como prática política do Estado Brasileiro, a interpretação dialética de Darcy Ribeiro enxerga na disseminação dessa ideologia a semente da sua destruição. Diz o autor:
“O vigor da ideologia assimilacionista, assentada na cultura vulgar e também ensinada nas escolas, e das atitudes que começam a generalizar-se entre todos os brasileiros de orgulho por sua origem multirracial, e dos negros por sua própria ancestralidade, permitirão, provavelmente, enfrentar com êxito as tensões sociais decorrentes de uma ascensão do negro, que lhe augure uma participação igualitária na sociedade nacional. É preciso que assim seja, porque somente assim se há de superar um dos conflitos mais dramáticos que desgarra a solidariedade dos brasileiros” (21)
Darcy Ribeiro acreditava no potencial do Brasil enquanto modelo de ‘Civilização do Terceiro Milênio’; “uma nova civilização, mestiça e tropical, orgulhosa de si mesma. Mais alegre, porque mais sofrida. Melhor, porque incorpora em si mais humanidades” (22) . Este potencial deriva justamente do fato de que a política de embranquecimento, e o lado oposto desta moeda — a mestiçagem, ferveram em banho-maria as fronteiras étnicas que, durante séculos, compuseram a sociedade brasileira. Nossa unidade deriva, portanto, do “mesmo processo civilizatório (…); de terem se formado pela multiplicação de uma mesma protocélula étnica e de haverem estado sempre debaixo do domínio de um mesmo centro” (23). Este potencial se revela quando paramos para pensar que, em um mesmo país, nasceu Pelé e Santos Dumont; João Gilberto e Carolina de Jesus; Machado de Assis e Ayrton Senna. Cândido Portinari e Darcy Ribeiro. Nada disso foi fruto de uma construção consciente e orientada do Estado brasileiro e sua classe dirigente; e sim manifestações espontâneas da genialidade brasileira. Segundo o próprio Darcy Ribeiro, o motivo pelo qual esta potência não se realiza de forma consistente e contínua, é “porque sua própria classe dirigente é o agente de sua dominação externa. Ao contrário do que ocorre nas sociedades autônomas, aqui o povo não existe para si e sim para outros” (24).
Envolto nas celebrações do bicentenário de nossa crise existencial, recolhendo os cacos deixados pela pandemia de COVID-19, o Brasil terá de escolher um presidente. Em um país onde a Petrobrás é esquartejada mês após mês para a venda ao capital estrangeiro, onde a Amazônia é engolida por chamas provocadas pelo interesse latifundiário na exportação de suas monoculturas (e tantas outras desgraças que tornam esses exemplos cotidianamente obsoletos); convêm superar os inventários das 3 raças em busca de um passado glorioso. Nosso passado não é glorioso, nós somos o que somos. Nossa “tradição oficial”, até hoje, tem sido a superexploração, a dependência e a subserviência internacional; não há nada que possa alterar essa História. Todas as voluntariosas tentativas de analisar aspectos identitários das nossas questões de origem limitam-se justamente a suas “sequelas” como destino final de seu trabalho; a condição colonial/dependente é um cenário passageiro ou um meio dessas identidades se afirmarem ou resistirem diante da opressão. Passam do ponto como um trabalhador cansado que só acorda duas estações depois do seu destino.
Em 2015, Vladimir Safatle escreveu na Folha de São Paulo duras críticas ao estado da música brasileira. O filósofo argumenta que “a ideologia cultural nacional sempre foi, em larga medida, uma ideologia musical”; aplicando ainda no século XX as estratégias de formação de ‘identidade nacional’ traçadas no séc. XIX (25) . Essa lentidão processual seria parte do inócuo desenvolvimento promovido pela República Velha. Com os paradigmas modernistas da Semana de 1922 e o progresso técnico desencadeado em 1930, a música brasileira pode desfrutar de destaque no debate cultural nacional. Seu artigo segue com uma análise dos momentos pelos quais a música brasileira passou desde o desenvolvimentismo dos anos 1950 até a decadência neoliberal do século XXI. Na época, o artigo se contrapunha ao argumento de que uma ‘popularização da cultura’ estaria em curso. Safatle declara:
“Ultimamente, todas as vezes que se levanta a regressão da qual a música brasileira é objeto se é acusado de elitista. Afinal, tais músicas teriam vindo dos estratos mais pobres da população brasileira. O que se chora seria, na verdade, o fim da dominância cultural da classe média urbana e o advento das classes populares e das classes do ‘Brasil profundo” (26) .
Essa aplicação de “um esquema tosco de luta de classes ao campo da cultura” foi um dos sintomas latentes da falência intelectual do ‘lulismo’. No entanto, o autor — provavelmente limitado pelo veículo — não estendeu sua reflexão para o estado da indústria cultural brasileira, a sua lógica produtiva e como ela se relacionava dialeticamente com a identidade nacional naquele momento. Afinal, aquela cultura criticada por Safatle não era um produto externo às condições materiais e políticas da sociedade brasileira; ela se relacionava intimamente com a hegemonia promulgada pelo período de redemocratização. Mesmo em seu pior estado, a música brasileira continua refletindo a realidade nacional. Entendo que a indústria cultural seguiu o dinheiro: voltou-se para o campo (leia-se Agronegócio) e abriu caminho para a evolução da música sertaneja comercial para uma fase superior, materializada no “estilo universitário” (27) . Não obstante, na primeira temporada do programa Esquenta! — vitrine máxima da cultura de massas à época criticada por Safatle — FHC deu uma entrevista defendendo a descriminalização das drogas e Lula (no dia 2 de janeiro de 2011, estreia do programa) deu sua primeira entrevista após a sucessão presidencial. Hoje a indústria fonográfica gira majoritariamente em torno do sertanejo universitário, do funk e, sazonalmente por conta do Carnaval, o samba e o axé. Esse eixo é alimentado por um número de ‘operários da composição’ musical que produzem de modo propriamente capitalista (em massa e alienadamente) letras, melodias, harmonias e arranjos genéricos que podem ser facilmente adaptados a qualquer um desses estilos.
Por isso que, por mais massificada que seja, “nenhuma proclamação da cultura nos eximirá de nossas tarefas fundamentais” (28) . Nascido na Martinica Francesa em 1925, Frantz Fanon tornou-se um dos mais influentes pensadores na luta anticolonial. Seu trabalho trouxe uma gigantesca contribuição ao conectar psicologia e filosofia política com uma prática radicalmente revolucionária. Em 1953, Frantz Fanon trabalhava no hospital psiquiátrico Blida-Joinville, na Argélia, quando no ano seguinte eclode a Revolução; em 1955 junta-se à Frente de Libertação Nacional. Acumuladas as missões de tratar de soldados francês e torturados argelinos, o autor decide renunciar ao seu posto no hospital francês e dedicar-se aos esforços de libertação do povo argelino. Nesse contexto escreve Os Condenados da Terra, lançado no final de sua vida em 1961. Este livro ficou amplamente conhecido no mundo pela defesa do uso da violência como instrumento na luta de libertação. O testemunho do autor, em meio a uma de tantas guerras de descolonização que tomaram o mundo após a 2ª Guerra Mundial, lhe permitiu captar com sensibilidade a contradição humana que existia entre colonizadores e colonizados. Essa advocacia da violência fez com que o livro fosse censurado pelo governo francês. Em meio à toda a controvérsia gerada na metrópole, foi Jean Paul Sartre quem melhor soube compreender a obra. No prefácio que posteriormente escreveu para o livro, Sartre é categórico: “esta não é uma obra para franceses.”
Os Condenados da Terra é também um alerta para os percalços do processo de descolonização no contexto de transição do neocolonialismo para a globalização. Destaca-se o capítulo 4 — Sobre a Cultura Nacional — em que Fanon faz uma primorosa análise sobre a evolução e a importância da cultura, da política e da cultura política no convívio e no conflito entre colonizados e colonizadores. O autor abre este capítulo anunciando que toda geração tem sua missão histórica; a de seus pais foi debater-se como puderam e se seu legado não repercutiu internacionalmente, restando apenas entender o motivo. A de sua geração seria regular todas as revoltas (29) . Em seguida propõe uma análise acerca dos problemas de legitimidade da reivindicação nacional; legitimidade essa que, uma vez estabelecida entre partido e povo, mobiliza e convida para a ação (30). Para enfrentar essa primeira fase da luta nacional, o colonialismo recorre ao economicismo. Simula preocupação com a sorte de um povo que julga tão indefeso e de um território que diz ser tão pobre — mas que são fortes e ricos o suficiente para aguentar séculos de exploração. Esta será a aposta do colonizador, até perceber que suas reformas não satisfazem as aspirações do povo colonizado. “Vale mais a fome com dignidade que o pão na escravidão”, arremata Fanon (31) .
O autor identifica uma contradição do discurso colonial, e como toda contradição política, essa não foge à regra quanto à sua utilidade para reforçar o domínio de classe: nações coloniais como França, Alemanha e Inglaterra afirmaram-se e tiveram o reconhecimento de suas culturas nacionais e atestam na prática a importância deste conceito para o desenvolvimento; mas (como foi dito posteriormente por Chatterjee) denunciam nacionalismos periféricos. Quando superado o fracasso de suas ameaças economicistas, partem para o discurso apocalíptico prevendo um “retorno da barbárie”. Fanon também critica posturas que buscam dividir erros e acertos entre colonizadores e colonizados; como se ambos estivessem em pé de igualdade na condução de seus destinos (32) . Esse pensamento é estéril, inócuo, universalista, conciliador e se prova totalmente inútil quando posto em prática. Esse fenômeno opera como um recalque político; uma tentativa desesperada de alterar a realidade para acomodar soluções confortáveis. É um “desvio de rota pantanoso” que, apesar do seu valor pedagógico, prolonga o caminho da Revolução. Uma vez completo esse desvio de rota — ou seja, uma vez que a realidade se impôs e nenhuma conciliação conseguiu solucionar os problemas — resta ao colonizado duas alternativas: resignar-se ou reagir. Fanon afirma que o colonizado começa sua reação redescobrindo seus signos e renegando todos os símbolos e gestos da cultura ocupantes. “Reencontrar o povo é fazer-se árabe, fazer-se o mais indígena possível, o mais irreconhecível, é cortar as asas que se tinha deixado crescer” (33) . Fanon enxerga a cultura colonizada passando por 3 etapas na evolução até sua fase nacional-libertadora (34) .
1.Assimilação exterior: trata-se da absorção da cultura dominante. Neste processo o colonizado fetichiza tudo o que lhe é estrangeiro. Não necessariamente com a mesma conotação sexual que Fanon discute em Pele Negra, Máscaras Brancas, ainda que haja um diálogo possível entre os dois. Mas certamente como a manifestação de uma idolatria na qual o colonizado busca um falso sentimento de pertencimento a uma cultura que não é a sua. É o momento em que o artista colonizado tenta emular o artista colonizador, copiando sua estética, sua temática, e o que mais for necessário para que o colonizador lhe garanta reconhecimento.
2. Recordação interior: É o processo de imersão do artista colonizado na sua cultura pré-colonial ou naquilo que se tornou periférico após a ocupação. É uma etapa interessante, onde a conexão entre passado e presente ativa a criatividade e gera necessárias discussões sobre identidade e comunidade. No entanto, esse processo pode facilmente entrar em um círculo vicioso; o que faz com que a metáfora do pântano empregada por Fanon ganhe outro significado: É fácil ficar preso nessa etapa; como argumentado anteriormente, o Brasil passou por 200 anos de crise existencial tentando elucidar o que constitui sua identidade. Vivemos hoje uma nova fase da afirmação de identidades neste país; uma fase em que constatamos avanços consideráveis ao nível de debate. Porém, a nível prático, superado o momento de implementação de políticas públicas dos anos 2000 e 2010, restaram meras afirmações de sucesso individual, fragmentação política e apropriação publicitária de símbolos históricos e lutas sociais legítimas. De todo modo, é o maior avanço desde a afirmação da controversa ‘democracia racial’ e as teses de Gilberto Freyre nos anos de 1930.
Frantz Fanon é muito claro ao afirmar que o colonialismo jamais se envergonhará diante de uma cultura estrangeira; portanto, a cultura em si não é uma força capaz de conduzir uma luta nacional, mas pode evidenciar esse combate (35) . O autor se opõe enfaticamente às tradições requentadas que em nada se conectam ao seu povo. Referindo-se às artes plásticas colonizadas como “reprodução estereotipada” Fanon antecipada o que Edward Said viria anos mais tarde a referir-se como ‘Orientalismo’ (36) .
“Só se pode avançar resolutantemente quando antes de tudo se toma consciência de sua alienação. Nós absorvemos tudo do outro lado. Mas o outro lado não nos dá nada sem, através de mil rodeios, nos curvar em sua direção (…) Absorver é também, em múltiplos planos, ser absorvido” (37) .
3. Agitação exterior: por fim, nesta etapa se manifesta como a ação do imaginário nacional”. O artista colonizado parte para o combate direto com seu colonizador. A imersão da etapa anterior tem o intuito de romper qualquer barreira entre a experiência do artista e de seu povo, fazendo com que nesta etapa sua arte emerja diretamente dessa experiência. Porém, mais do que a acusar a exploração — que certamente constitui um estágio importante entre as fases 2 e 3 — Fanon exprime a necessidade de que um autêntico artista nacional ofereça uma perspectiva de futuro. Sua perspicácia deve estar sempre atenta para denunciar o perpetrador da miséria do seu povo; sua criatividade deve oferecer ao seu povo a visão de um novo tempo. O artista, como agente revolucionário, é o mais autorizado para trabalhar com utopias.
“O homem colonizado que escreve para seu povo deve, quando utiliza o passado, fazê-lo com o propósito de abrir o futuro, convidar à ação, fundar a esperança (…) para lhe dar densidade, é preciso participar da ação, engajar-se de corpo e alma no combate nacional” (38) .
Portanto, Frantz Fanon compreende que qualquer defesa de uma cultura nacional periférica deve ser uma luta pela libertação nacional que combine “esforços feitos por um povo no plano do pensamento para descrever, justificar e cantar a ação através da qual o povo se constituiu e se manteve” (39) ; orientada pelo ritmo do seu povo, com a constante tarefa de ajudar-lhe a conceber o futuro. Voltando para o debate levantado por Safatle, ao atacar o débil e oportunista esquema de classes defendido à época, o filósofo comete um erro de leitura histórica. Reforço que o veículo limitado provavelmente impediu o autor de desenvolver mais linhas sobre o tema, mas é desconcertante a afirmação:
“não há arte proletária, cultura proletária (…) pois, como dizia Marx, os proletários são aqueles que não têm religião, Estado, moral (e acrescentaria música, cultura). Por isso, eles são a indicação do que ainda não tem forma nem imagem” (40) .
Claro, se nos limitarmos ao que a ‘cultura oficial do Estado’ ou o que a produção da indústria cultural tem para nos oferecer, realmente, não há espaço para o imaginário proletário. Porém, a cultura nacional se relaciona de forma dialética também com os elementos não oficiais. Ou seja: a cultura não é apenas o que está na indústria, mas também o que está na margem; na periferia. Artistas independentes, contraculturais e de vanguarda também compõem o imaginário cultural de uma nação. A origem para a regressão musical apontada por Safatle é fruto de nossa dependência. Tal como nossa burguesia, a indústria cultural brasileira é caudatária dos avanços técnicos e inovações estéticas produzidas pela metrópole econômica. Por isso, defendo que no caso brasileiro, por se tratar de uma nação periférica, o imaginário promovido por artistas marginais ao status quo pode ser mais fiel ao imaginário popular do que a ideologia produzida pela indústria cultural. Esta parece ter sido também uma preocupação não só da Tropicália, como de todo o cenário cultural brasileiro nos anos 1960.
1.2 Modernismo
Agora, é necessário apresentar uma pequena correção de curso. As categorias de análise para uma arte nacionalista propostas por Frantz Fanon tinham em mente um país cuja luta de libertação e construção nacional estivesse em curso. Portanto, as etapas de evolução para os artistas estariam ligadas ao avanço deste processo histórico. Transpondo essa visão para a História do Brasil, dificilmente encontraríamos um momento comparável ao que pensava Fanon. Por mais sedutor que seja encarar os tropicalistas como artistas revolucionários, este trabalho partiria com a enorme desvantagem de estar errado. Em primeiro lugar, além dos documentos referentes à prisão de Caetano Veloso (41) não há nenhuma evidência que suporte a tese de envolvimento dos tropicalistas com algum projeto que visasse uma tomada de poder. Em segundo lugar, a Tropicália emerge após o golpe de 1964. O otimismo iludido dava espaço para a incerteza resiliente. O “amanhã redentor”, comentado por Walnice Nogueira Galvão (1976) (42) , não mais representava um dia melhor que virá; mas um menos pior. Entretanto, não significa dizer que os tropicalistas não estavam influenciados pelo espírito revolucionário que permeava o Brasil pré-1964. A sociedade na qual se formaram os tropicalistas, era uma sociedade politicamente marcada por diferentes conceitos de modernismos em disputa pela materialização da modernidade brasileira. Fosse uma revolução democrático-social, liberal ou conservadora; a modernidade brasileira seria revolucionária. É esta disputa que possibilita utilizar as análises propostas por Frantz Fanon, pois dela emergem inúmeras imagens possíveis para o Brasil. Por isso, é necessário estabelecer um debate sobre modernismo e seus projetos culturais e políticos. Como veremos adiante, é por meio do desenvolvimento da modernidade brasileira que a Tropicália encontra as condições materiais e espirituais de conceber e produzir seu trabalho. E, por meio do seu trabalho refletir, não necessariamente o que o Brasil seria, mas o que é; e fundamentalmente, o que poderia ter sido. Como diz Marcos Napolitano:
“Num dos países mais ricos em diversidade sonora do mundo (…) dedicar-se à história da música, pensada em diálogo com a história intelectual, social, política e cultural, é dar um passo a mais na compreensão da própria sociedade e suas formas de auto-representação” (43) .
Para analisar os conceitos de modernidade e modernismo em relação à obra tropicalista, se faz necessário um debate em duas etapas. Primeiro, o que foi o modernismo no campo cultural e sua evolução no Brasil até os anos 1950–60. Em segundo lugar, quais eram as principais vertentes intelectuais daqueles tempos que produziam a ideologia política da modernidade brasileira. É importante ressaltar que, debates e disputas sobre a melhor modernização para o Brasil são tão antigos quanto o próprio país. Nossa condição colonial estabeleceu um latente atraso não só político, econômico e social, mas também intelectual e técnico. Em O modernismo e a questão nacional (2014), Mônica Velloso apresenta um panorama da evolução do pensamento modernista brasileiro a partir de 1870. Seu trabalho se apoia em uma interpretação interessante do modernismo enquanto movimento contínuo; um processo que desencadeia outros processos (44). A Revolução Industrial na metrópole capitalista e a Guerra do Paraguai alteraram sensivelmente a sociedade brasileira no último quarto do século XIX. Essa nova sensibilidade se materializa, em um primeiro momento, no Manifesto Republicano de 1870. Velloso elenca neste documento, os pilares do que se entendia naquele momento por um Brasil moderno: republicano e livre da escravidão. Eventualmente, este Brasil veio a se concretizar, mas de forma alguma a sensação de atraso em relação às nações do norte global foi completamente liquidada. É importante pontuar que no seio do movimento republicano brasileiro, existiam figuras díspares. Sob a bandeira republicana estavam Prudente de Morais, oligarca da cafeicultura paulista e 3º Presidente do Brasil; e Octaviano Hudson, poeta carioca e fundador da Liga Operária. Ou seja, mesmo o movimento republicano carregava a marca da divisão entre a burguesia agrícola e o operariado urbano. Com o triunfo das vertentes oligárquicas, o que se concretizou na 1ª República foi, em larga medida, a continuidade dos conceitos de modernidade que já vinham sendo debatidos no IHGB desde sua fundação. Diz Velloso:
“Predominava, até então, a visão pessimista da nacionalidade, caracterizada pelo “atraso cultural” e pela “inferioridade étnica”(…) a ideia subjacente era a de que esse quadro de atraso e inferioridade poderia ser modificado, desde que o país conseguisse acelerar a sua marcha evolutiva, integrando-se ao contexto internacional” (45).
A imagem propagada pelo Romantismo da virada do século, de um Brasil “exótico”, lar de uma natureza selvagem e encantadora, contrastava com o anseio das elites em “europeizar” a nação. Voltamos aqui à ideia de “nação interrompida” de Darcy Ribeiro para atentar ao fato de que um dos inúmeros obstáculos impostos pela elite para o pleno desenvolvimento democrático brasileira foi a eugenia. A natureza caudatária das nossas elites se manifestava no campo da cultura, colocando o artista brasileiro como um mero aprendiz das melhores práticas estéticas vindas da Europa. Velloso compreende que este período entre 1870 e 1914 deve ser visto como a preparação do terreno para a modernização conservadora que marcaria a década de 1930”: autoritária, porém, inegavelmente dotada de uma sensibilidade modernista (46). Sensibilidade esta, que compreendia a modernidade como um projeto fixo; um modelo a ser seguido. E este modelo era o europeu. Mas o corte da autora se dá em 1914, pois após a 1º guerra mundial, “a visão da nacionalidade e da arte como força primitiva, espontânea, indomável e marcada, particularmente, pela ideia de inferioridade étnica não se sustentava mais” (47). A forma de pensar o Brasil iria se transformar na esteira da mudança geral do mundo. Os horrores da 1ª guerra colocaram em xeque o modelo civilizatório europeu. A América se tornava o novo farol do mundo, com os EUA como sua força motriz e sua matriz econômica (48).
A autora identifica na “intelectualidade boêmia” do Rio de Janeiro uma primeira antítese, mais organizada e consciente, oposta à cultura oficial das elites. Ainda que excluídos pela ideologia dominante, o povo não deixou de exercer sua cultura. A genialidade espontânea do brasileiro logo começou a gerar figuras como Lima Barreto e José do Patrocínio; Donga e Pixinguinha; entre outros gênios populares. Na contramão de Andreas Huyssen (1996), que identifica a modernidade na oposição entre “alta cultura e cultura vernacular” (49) , Velloso encontra na aproximação da intelectualidade de classe média com a genialidade popular a semente de uma expressão de modernidade originalmente brasileira (50) . Da massa crítica formada por esta geração partem alguns dos elementos mobilizados nos anos 1920, 1930 e 1940 para debater a modernidade brasileira. Mônica Velloso elege alguns artistas e movimentos que influenciaram a época; entre eles, Oswald e Mário de Andrade, e os signatários do grupo Verde-Amarelo. Estes últimos, orientados por uma espécie de neo romantismo, compreendem a modernização brasileira como consequência da sua geografia. Plínio Salgado, Cassiano Ricardo, Guilherme de Almeida, entre outros, “identificam o interior com a brasilidade e a autenticidade em contraposição ao litoral, associado à ideia de cosmopolitismo, fachada e artifício” (51). O ufanismo, a apologia das tradições provincianas e a hostilidade ao estrangeiro dariam, anos mais tarde, a tônica da Ação Integralista Brasileira.
O movimento surge como uma resposta aos paradigmas introduzidos pela Semana de Arte de 1922; especialmente às concepções apresentadas pelos irmãos Andrade. Como afirma Velloso, Mário, não atribuía valor inerente às tradições (52). Macunaíma, o herói sem moral, é definido de tal forma, pois sintetiza a ideia de um homem sem religião, Estado ou moral. Ergue-se, não na concepção dogmática de Safatle acerca do proletariado, mas como analogia à condição de “ninguendade” explorada por Darcy Ribeiro. Mário de Andrade explorou essa condição de “tábula rasa” da nacionalidade brasileira para propor sua construção a partir da “qual se descobre — além das diferenças regionais que comporta uma nação — uma unidade subjacente relativa à sua identidade (…) tentando uma apreensão conjunta da nacionalidade” (53). Só então o país estaria apto a uma inserção no cenário internacional. Nas palavras de Mônica Velloso:
“A instauração do moderno, a entrada do Brasil no concerto internacional obrigou a uma autorreflexão por parte da intelectualidade. Foi necessário lançar um olhar retrospectivo sobre a nossa história e sobre as nossas raízes, no intuito de poder construir a ideia de brasilidade. Impunha-se efetuar não apenas uma tarefa imediata visando à atualização da nossa cultura” (54).
Há um paralelo possível entre as propostas de Mário de Andrade para a construção da nacionalidade brasileira e a segunda etapa de Frantz Fanon para a arte revolucionária (55). Mário e Fanon dividem a convicção de que é preciso mergulhar na tradição dominada ou marginalizada para dela emergir como um “novo homem”. Também partilham da desconfiança de que absorver é também ser absorvido. Onde os dois detinham-se, Oswald de Andrade avançava. Dois manifestos redigidos por Oswald são fundamentais no debate sobre a construção da modernidade nacional; O Manifesto Pau-Brasil (1924), e, O Manifesto Antropofágico (1928). No primeiro, em busca de sustentar a síntese experimentada pela cultura “boêmia” do Rio de Janeiro, Oswald busca “criar uma percepção baseada no princípio da síntese cultural, capaz de unir o “lado doutor” da nossa cultura com as tradições populares” (56). Já no segundo, o autor propõe uma forma segura e construtiva para o Brasil abrir-se para as ideias internacionais sem perder sua peculiaridade. E peculiar é a metáfora que Oswaldo busca: a antropofagia. A antropofagia dos Tupinambás diferencia-se do canibalismo por seu caráter ritualístico. Não se devora o inimigo por prazer ou qualquer valor nutritivo. Após os combates, os valentes prisioneiros de guerra passavam por um ritual que incluía músicas, danças e até uma esposa da tribo que o capturou. Ao final, seriam devorados para que suas qualidades fossem transmitidas (57). Transposto para as palavras de Oswald: “O Carnaval no Rio é o acontecimento religioso da raça. Pau-Brasil. Wagner submerge ante os cordões de Botafogo. Bárbaro e nosso” (58). As concepções de Oswald de Andrade preparavam a cultura brasileira para incluir criticamente elementos estéticos internacionais e, a partir dessa crítica, afirmá-los enquanto elemento constituído de brasilidade. Em outras palavras, dava dentes para mastigar o inimigo devorado; absorver sem ser absorvido. Retomaremos esta discussão mais adiante, quando discutirmos a introdução da guitarra elétrica e outras técnicas fonográficas nos anos 1960.
Por hora, estes são alguns dos paradigmas que orientam o modernismo cultural. Seu desenvolvimento, deflagrado a partir de 1914 no choque entre a cultura elitista-eurocêntrica e as diversas culturas populares-nacionais, produziu novas antíteses expressas nas mediações de Plínio Salgado, Mário e Oswald de Andrade. A dialética entre esses elementos vai nortear o debate cultural até meados da década de 1940; e será posteriormente resgatado no contexto pré-1964. Um detalhe importante, que coincide com o corte temporal de Mônica Velloso, é a pouco comentada presidência do Marechal Hermes da Fonseca. Seu mandato, encerrado justamente em 1914, ficou marcado, dentre outras coisas, pela aproximação do poder executivo e das Forças Armadas; especialmente as patentes intermediárias. O tenentismo, como ficou conhecido, representou um ponto de inflexão na História do Brasil. Luiz Felipe César Mundim (2013), observa em documentos como a Doutrina de Segurança Nacional, “elementos históricos estruturais do combatente nas fileiras rebeldes do tenentismo, da década de 1920, e do vencedor em plena “caminhada no altiplano” a partir da “Revolução” de 1930” (59). Da Revolução de 1930, até os primeiros governos da ditadura militar, quadros emergentes do tenentismo — como Castello Branco, Geisel, Juarez Távora e Juraci Magalhães — exerceram papéis ativos no Estado brasileiro e na ordenação ideológica do regime. Esta intelligentsia, se materializa após 1945, a Escola Superior de Guerra (ESG); responsável pela produção de boa parte da doutrina ideológica do corpo militar. O resgate do papel “moderador” das Forças Armadas, exercido fundamentalmente nos mandatos dos Marechais Deodoro e Floriano, e a adoção de uma postura tecnocrata pelo Estado, orientaram os trabalhos da ESG. Diz Mundim:
“O que se torna perceptível, desde a criação da ESG, é que existia uma evolução conceitual e, portanto, desenvolvimento fecundo da doutrina ideológica militar para a formulação do poder a ser adotado pelo Estado. Essa evolução conceitual correspondia às heranças provenientes do tenentismo e suas características perpetuadas e atualizadas em Juarez Távora, e do papel da ideologia militar, inicialmente desempenhado por Góes Monteiro e potencializado pela própria produção intelectual da intelligentsia da Escola nas décadas de 1950 e 1960” (60)
A obra escrita por Juarez Távora “apresenta suas ideias para centralização e racionalização do Estado, frente a um diagnóstico que levaria adiante em todas as obras: a incorrigível desorganização do Brasil” (61). Outro ideólogo do regime militar foi o General Golbery. No seu caso, Mundim aponta “a composição de um sistema simbólico que se pretendia hegemônico, enquanto levava adiante a autoconsciência de uma missão de salvação nacional” (62) . Seu trabalho era investir na burguesia o compromisso moral em torno do Estado. Essa moral, ora apelava para o desenvolvimento nacional, ora para o anticomunismo e os interesses estadunidenses. Luiz Felipe César Mundim indica a relação estreita entre a ideologia produzido por Golbery e a produzida pelo Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e ao Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) (63).
Estas duas instituições, em especial o IPES, são interpretadas por diversos autores como o núcleo ideológico responsável por forjar o consenso liberal por trás do golpe civil-militar (64) . Abrigando empresários, intelectuais, publicitários, jornalistas e egressos do ESG, o IPES inundou os meios de comunicação com propaganda anticomunista, anti-João Goulart e pró-multinacionais, liberalismo e EUA. Por meio de uma investigação das atas produzidas nas reuniões do IPES, Aline Pereira (2013) aponta outros elementos fundamentais para compreender seu projeto para o Brasil moderno. Chama atenção a escolha deliberada de “atuar nas sombras”. Como diz a autora, “o Ipês deveria se manter sempre por trás, nunca aparecendo claramente, evitando agir como um partido político e optando pelo uso do poder econômico” (65) . E por onde agiria este poder econômico? Por meio do lobby nos meios de comunicação e no Congresso Nacional. Em relação ao Congresso, Pereira diz que, “a preocupação é sempre a mesma: assessorar o congresso, tendo um homem do Ipês lá” (66). Já, em relação aos meios de comunicação, diz a autora:
“Dentre as formas discutidas de divulgação das ideias ipesianas pela imprensa cogita-se a compra de jornais e estações de rádio no Rio e em São Paulo. Contudo, a ideia que prevalece é que se mantenha o esquema de matéria paga em jornais” (67).
Como veremos mais adiante, a despeito da hegemonia da esquerda na produção cultural, os meios de comunicação, via de regra, estavam na mão dos liberais. Agora que vimos onde e como atuava o IPES, precisamos nos perguntar pelo que eles agiam Qual era seu projeto de modernidade para o Brasil?. Em suma, o projeto ipesiano não era exatamente original. Aline Pereira destaca frases vagas como “o desenvolvimento econômico e social para elevar o padrão de vida do povo brasileiro como um todo” (68); ou termos ambíguos como ‘democracia’, ‘liberdade’ e ‘propriedade privada’: “Uma democracia em que todos sejamos proprietários. Então devemos nos antecipar nas concessões, isto é, dar antes”. (ATA, 22/01/1963)” (69). O IPES nada mais foi do que um braço da política externa do governo Kennedy nos EUA. Sua tarefa: “editar a Aliança para o Progresso para torná-la acessível a toda a população brasileira através de encarte de jornal” (70). Analisando em conjunto, o IPES, com seu discurso pela manutenção da ordem, dava sentido econômico para as formas políticas pensadas pelo ESG e seus ideólogos. Essa síntese punha seu projeto de modernidade em disputa com aquele produzido pela intelectualidade que, não só apoiava João Goulart, como vinha apoiando todo o nacional-desenvolvimentismo desde JK.
O Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), fundado em 1955, foi o principal responsável por elaborar a teoria por trás do nacional-desenvolvimentismo. Subordinados ao Ministério da Educação e Cultura, dedicavam-se a estudar, ensinar e divulgar as ciências sociais sob uma perspectiva nacionalista. Criados ainda no governo Café Filho, foi durante o mandato de Juscelino, sua política de industrialização, investimento público, privado nacional e estrangeiro, que o ISEB viu materializar-se algumas das suas concepções teóricas. Dentre seus principais quadros estão Álvaro Vieira Pinto, Hélio Jaguaribe, Alberto Guerreiro Ramos e Nelson Werneck Sodré. Guardaremos as reflexões de Álvaro Vieira Pinto para um momento posterior, e vamos por hora analisar a contribuição dos outros três para a disputa pela modernidade brasileira. Hélio Cannone identifica em Jaguaribe a semente do pensamento isebiano que seria posteriormente desenvolvida pelos outros autores. Suas teses apoiavam-se na compreensão de um Brasil que “se dividiria politicamente entre nacionalistas e entreguistas (ou cosmopolitas), admitindo que as duas definições seriam vagas e englobariam muitas diferenças” (71). Jaguaribe distinguia o nacionalismo da periferia do nacionalismo presente no centro do capitalismo global:
“O nacionalismo seria aspiração fundadora e preservadora da nacionalidade que, dada as condições objetivas para tal, se constitui como projeto nacional (…) O primeiro seria integrador, próprio da fase em que o Brasil se encontraria. O segundo seria o imperialista, fenômeno de países cêntricos, cujo desenvolvimento econômico e cultural extravasou o território da nação” (72).
Para um país como o Brasil, Jaguaribe identificava no nacionalismo a tarefa de acelerar o desenvolvimento das forças produtivas. Porém, o autor encontrou no arranjo político-social um obstáculo para o pleno desenvolvimento. Em suas concepções, a burguesia “industrial teria a propensão de assumir o comando do processo econômico e social, mas o Estado brasileiro era de tipo agrário, dominado por coronéis que conservavam um poder excessivo” (73). Já a classe média:
“cultiva preconceitos anti-industriais e anti-proletários, parcialmente motivados pelo fato de que na evolução de uma sociedade agro-pastoril para uma sociedade industrial, tendem a desaparecer as pequenas sutilezas da hierarquia social, em torno do qual tanto se aferra a classe média” (74).
Jaguaribe afirmava a burguesia como a classe sobre a qual se reuniam os interesses por uma modernização acelerada e nacionalista. Já Alberto Guerreiro Ramos, partindo da crítica ao latifúndio feita por Jaguaribe, abarca o povo como parte constitutiva do processo de modernização. Também entendendo os latifundiários como classe dirigente a ser derrubada, apostava na união de interesses da burguesia com o povo brasileiro o caminho para sua superação. Filiado ao Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e adepto do Trabalhismo, Alberto Guerreiro Ramos apresenta em sua obra, o povo e a classe trabalhadora como sinônimos; “o trabalhador aparece como sócio do desenvolvimento nacional e como força política sem a qual um governo não mais se sustentaria” (75). Essa linha que apostava na união de interesses entre burguesia e proletariado orientou não só o PTB, como também o Partido Comunista Brasileiro (PCB) durante todo período da 4ª República. Em seus escritos, Guerreiro Ramos e Nelson Werneck Sodré não falavam apenas em termos de ‘modernização’, mas empregavam constantemente o conceito de ‘Revolução Brasileira’. Sodré se dedicou especialmente ao papel do povo nesse processo revolucionário. Diz Cannone:
“Para Sodré, os trabalhadores seriam a massa principal do povo, mas, no Brasil, o povo não compreenderia somente o trabalhador, de mesmo modo, o conceito não poderia ser só definido economicamente, mas historicamente (…) O povo, composto pelo campesinato, o proletariado e por setores da burguesia comprometidos com o interesse nacional e anti-imperialista, precisaria liquidar a classe latifundiária e suas relações com o imperialismo” (76).
Ao contrário de Alberto Guerreiro Ramos, Sodré era filiado ao PCB. Seu horizonte compreendia uma eventual tomada do poder pela classe trabalhadora. Mas, ao entender nos latifundiários o papel da classe dirigente, seria antes necessária uma ascensão da burguesia ao poder. Uma vez cumprido o papel histórico da burguesia, e com as forças produtivas plenamente desenvolvidas, uma transição socialista poderia começar. Em suas próprias palavras:
“uma revolução democrático-burguesa, mas de tipo novo, em que a componente burguesa não terá condições para monopolizar os proventos da revolução. As possibilidades de operar o desenvolvimento material e cultural do Brasil para proveito apenas da burguesia estão encerradas.” (77).
Estes constituem as três principais vertentes do pensamento político brasileiro, da direita à esquerda, acerca da modernidade nos anos 1950 e 1960. Na maioria dos trabalhos sobre a Tropicália, debates sobre modernismo e modernidade limitam-se às vertentes culturais; quando muito, pontuam a atuação do IPES ou da ESG na contextualização do golpe militar. Porém, esta longa explanação se justificará quando buscarmos os reflexos dessas ideologias na obra tropicalista e na sua relação com o cenário cultural. Os ventos revolucionários que sopravam do ISEB moviam os moinhos da UNE e dos CPCs. As concepções de Guerreiro Ramos e Nelson Werneck Sodré sobre revolução, e especialmente, sobre o povo brasileiro, tematizaram boa parte das produções marcadas sob o signo da estética nacional-popular. Um equívoco muito comum dos analistas é encarar a linha da revolução ‘democrático-burguesa’ como uma teoria orgânica adotada pelos marxistas de todo o Brasil. Fazer esta distinção se faz necessário, pois, por vezes as críticas à estética ‘nacional-popular’ revestem-na (para mal ou para bem) de uma “aura revolucionária” que degenera em interpretações enviesadas. O termo ‘marxista’ vem sendo usado com muito pouco cuidado para descrever os artistas do ‘nacional-popular’. Em verdade, Roberto Schwarz, marxista atuante daqueles tempos, relatou que em oposição às interpretações etapistas da luta de classe “o estudo acadêmico devolvia aos textos de Marx e Lênin a vitalidade que o monopólio do PC lhes havia tomado; saindo da aula, os militantes defendiam o rigor marxista contra os compromissos de seus dirigentes” (78). Veremos mais sobre isso em outro momento. Por ora, vale pontuar a crítica que uma dessas vozes dissidentes faziam ao PCB. A Organização Revolucionária Marxista Política Operária (POLOP), fundada em 1961, pretendia formular uma vanguarda capaz de organizar a classe operária em um partido revolucionário. Influenciados pela obra de Rosa Luxemburgo, destacaram-se na crítica da estratégia ‘democrático-burguesa’ que geria o desenvolvimento brasileiro. Quanto às suas críticas ao PCB, Ernesto Martins (2009) elenca em primeiro a falta de compromisso com a construção de uma classe para si. Em segundo lugar, o rebaixamento teórico, que limitou o marxismo à uma luta pelos direitos dos trabalhadores dentro da ordem. Em terceiro lugar, as duas falhas anteriores submeteram o PCB à uma dependência do Komintern. Some-se a isso o fim da III Internacional após a Guerra Civil Espanhola e qualquer expectativa no movimento comunista internacional estava enterrada. A URSS não poderia arriscar um aprofundamento do seu isolamento econômico; uma revolução fracassada no terceiro mundo poderia significar um parceiro a menos para o desenvolvimento soviético (79). A exposição desta crítica nos serve para duas coisas: entender, de uma vez por todas, que nem mesmo os marxistas acreditavam que Jango e suas Reformas de Base colocariam o Brasil na “rota de Moscou”. E observar que a raiz da estética ‘nacional-popular’ não reside em um projeto revolucionário marxista, mas em uma série de reformas ‘democrático-burguesas’, orientados pelo nacionalismo. Essa distinção teórica, e o devido posicionamento das figuras políticas dos anos 1960, nos ajudarão a compreender melhor outro conceito político frequentemente mobilizado pela historiografia sobre a música popular da época — e raramente com o devido cuidado teórico: o populismo.
1.3 Populismo
O termo ‘populismo’ vem sendo empregado nas análises culturais dos anos pré-1964 de forma extremamente difusa. Até mesmo Darcy Ribeiro se questionava:
“O que é populista? Esse conceito que os intelectuais de São Paulo enchem a boca dessa bobagem. O que é populista? Populista deveria ser Adhemar de Barros e Jânio Quadros — quem fazem o discurso que o operário quer, para servir a classe dominante. Seria populista Getúlio Vargas, que foi levado ao suicídio, que iria criar a Eletrobrás? É populista Jango, que posto para fora, que foi derrubado, que queria fazer a reforma agrária, contra todas as multinacionais? É populista Brizola, que é um homem que mais claramente quer passar o Brasil a limpo? É uma estupidez. Que populismo é esse que eles falam? O que eles chamam de populista não será o popular?” (80).
As teorias acerca do populismo é um dos casos mais interessantes para se observar uma “genealogia evolutiva” das teorias sociais e historiográficas. É um emaranhado de interpretações impossíveis de se navegar sem a mediação de um debate historiográfico, e Norberto Ferreras (2011) nos auxilia nesta tarefa. Começando pelos conceitos estabelecidos por Gino Germani (1962) e sua teoria da modernização, vemos uma espécie de tronco de onde partiram outros ramos da pesquisa sobre o tema. Em síntese, a teoria da modernização compreendeu as experiências de Lázaro Cárdenas, no México, e Juan Domingo Perón na Argentina, como etapas necessárias para um desenvolvimento acelerado do capitalismo latino-americano (81) . Ambos seriam líderes carismáticos que haviam encantado as massas para apoiar-se nelas para a implementação das suas reformas políticas e projetos de poder. Essas massas, inocentes e ignorantes politicamente, receberiam em troca benefícios sociais em troca do apoio. Da teoria da modernização formaram-se as bases para o desenvolvimento das correntes histórico-culturais — em destaque, as correntes marxistas e dependentistas. Em comum, compreenderam o populismo como efeito da crise de 1929 nos sistemas de agroexportação e monocultura; bases da economia no México, na Argentina e também no Brasil. Fernando Henrique Cardoso, Francisco Weffort, e outros dependentistas, concluem que os populismos, com suas atuações autoritária, porém carismáticas, e as pretensas benevolências estendidas às massas a fim de adestrá-las, rompem com a continuidade democrática (82). Maria Helena Campelato (2001), critica a concepção, herdada de Germani, que colocava no carisma o “segredo” dos populistas para “encantar” as massas (83). Esse encantamento pressupõe o caráter passivo do povo; e é muito comum ver essas interpretações serem acompanhadas de cortes temporais que apontam os governos populistas como a origem da mobilização popular. Tais interpretações carecem de um aprofundamento sobre as origens operárias dos movimentos anarquistas do início do século XX, e das organizações de trabalhadores republicanos, especialmente a partir da década de 1870. Já Norberto Ferreras rebate os dependentistas e sua análise sobre o caráter autoritário dos populistas; afirmando que a democracia liberal não vivia seu auge naqueles anos 1930 e 1940 (84). Basta nos lembrarmos que Stalin era Secretário Geral da URSS, o colonialista Winston Churchill era 1º ministro da Inglaterra, Mussolini na Itália, Franco na Espanha, Salazar em Portugal e Hitler na Alemanha. Mesmo nos EUA, onde a encenação democrática sempre foi muito rígida, Franklin Delano Roosevelt foi, até hoje, o único que presidente a emplacar quatro mandatos seguidos; uma verdadeira anomalia que não nos salta os olhos.
Nelson Werneck Sodré, Florestan Fernandes, e outros marxistas, por outro lado, viram nas contradições do populismo e suas alianças de classe, o surgimento da consciência de uma classe trabalhadora para si (85). Estas interpretações estão diretamente conectadas com os postulados sobre a modernidade brasileira expostos anteriormente. Resta dizer que, as contradições e alianças de classe assinaladas pelos marxistas estão no foco da corrente conjunturalista. Autores como Daniel James e Angela de Castro Gomes entendem que, ao contrário dos marxistas que afirmam o populismo como gerador de contradições, são estas contradições que geram o populismo. São os conjunturalistas que vão finalmente conceber suas teorias considerando a agência ativa da classe trabalhadora; não mais como um conjunto de indivíduos ignorantes, migrados do campo para a cidade e perdidos no tempo entre a sociedade tradicional e industrial (86). Mas sim, indivíduos que encontraram na heterogenia de suas demandas os consensos capazes de formar novas hegemonias. Apoiados em E. P. Thompson, compreendem o populismo como um produto específico daquela conjuntura que encontrou soluções a meio caminho entre a subserviência reformista e a ruptura revolucionária. Por fim, as correntes que analisam discursos — inauguradas na obra de Ernesto Laclau — partem da mesma compreensão de agência ativa dos trabalhadores, mas buscam analisar o populismo como uma dialogia; onde as vozes do Estado populista exerciam e sofriam influências sobre as vozes do povo (87).
Desta corrente, Guita Debert (2008) destaca-se com uma analise focada em figuras centrais para a compreensão da cultura política dos anos 1960: são os governadores, Adhemar de Barros (SP), Carlos Lacerda (RJ), Miguel Arraes (PE) e Leonel Brizola (RS). Uma primeira análise do discurso dos quatro irá encontrar termos em comum que poderiam assinalar algum tipo de aproximação entre eles. Porém, Debert alerta a necessidade de identificar “em que contexto esses termos são utilizados e que tipo de relação estabelecem com os outros termos presentes no mesmo discurso” (88) . A autora dá especial atenção ao povo enquanto símbolo recorrente nos diversos pronunciamentos destes políticos. Essa distinção é bastante importante, pois o povo também é mobilizado simbolicamente em inúmeras obras da estética nacional-popular, permeando todo o cenário cultural dos anos 1960. Em Adhemar de Barros, o povo é um amontoado de indivíduos que precisam do Estado para realizar suas necessidades individuais
“Este caráter ambíguo do Estado, que atende a todos de acordo com a capacidade de cada um, ao mesmo tempo em que é hipostasiado no divino, poderia abrir espaço tanto para um projeto de ascensão individual como para a esperança de uma redenção vinda de fora” (89).
Já para Carlos Lacerda, o povo era “sobretudo, o conjunto de indivíduos que pagam impostos e por isso devem exigir que a máquina estatal funcione devidamente” (90). Diante de um líder digno e honrado, o Estado brasileiro se transformaria não apenas no provedor de direitos como da justiça. A tentativa histórica de Lacerda em convencer o povo de ser ele esta figura denuncia o caráter personalista do seu discurso. No discurso de Miguel Arraes, o povo é mobilizado na ideia de pacto de classes. Sua força se explicita a depender do momento e da situação em que é proferido o discurso. Simboliza um elemento importante para o projeto, mas sua centralidade varia de acordo com cada interpretação. O povo só existiria, em si, enquanto parte constitutiva de uma aliança de classes.
Não é o caso dos discursos de Leonel Brizola, onde o povo é imbuído da força motriz da nação e de seu critério de autenticidade. Para Brizola, o povo brasileira era um sujeito ativo. Segundo a autora, ao tratar do povo, Brizola “faz dele a fonte na qual as elites devem se inspirar para tornarem-se “autênticos” sujeitos da transformação” (91). Brizola via no povo brasileiro o motivo pelo o qual, e para qual, se deveria buscar um projeto de modernização. Uma vez estabelecido este debate, seguiremos para a mobilização do populismo no campo da cultura dos anos 1960. Gláuber Rocha destacou-se na “santidade tropicalista”, entre outras coisas, pela crítica política apresentada em Terra em Transe. Seus alvos foram a demagogia, a paralisia, a capitulação e o oportunismo político; além dos meios e fins da burguesia para alcançar seus objetivos. O filme narra de forma não-linear um país sul-americano fictício chamado Eldorado. Acompanhamos o poeta Paulo Martins que, a despeito de seus impulsos revolucionários, transita seu apoio entre o conservador Porfírio Diaz e o demagogo Felipe Vieira. Vemos também Júlio Fuentes, um burguês proprietário de meios de comunicação em massa. Em suma, Diaz representa os militares; Fuentes, os liberais; Vieira, os demagogos e Paulo Martins representa os pretensos revolucionários que, na verdade militam pelo reformismo.
Ao passo que o apoio de Martins à Diaz era motivado por impulsos individuais, representados em cenas de orgias entorpecentes; a aproximação do poeta com Vieira se justificava na promessa de justiça social. Apesar da postura e tom de voz heroicos que o ator Jardel Filho empresta ao poeta, suas ações estão estreitamente comprometidas com sua derrota política e pessoal. Quando a postura de Felipe Vieira se revela demagógica, Martins não titubeia em também trair o povo; sua crise de consciência posterior é apenas o preço pago pela capitulação covarde de seus objetivos. Duas cenas são muito emblemáticas quanto a esse choque entre prática e consciência. A primeira divide-se em dois momentos: no primeiro, Vieira, em campanha, escuta com atenção os problemas de um líder camponês. O demagogo, enquanto candidato a Governador da Província de Alecrim, promete resolver tudo; para mais adiante voltar não mais cercado de festa, mas de tropas que reprimem o povo e assassinam o líder popular. Nesta cena o poeta Paulo participa da ação sem vacilar, mas é a partir deste momento que sua consciência entra em deterioração. A segunda cena mostra Vieira agora candidato à presidência contra Porfírio Diaz. Em mais uma atitude oportunista e demagógica, sua campanha dá ao “povo” a chance de falar. Fala então o presidente do sindicato que diz que está na luta ‘das classes’, que o país está uma confusão, e que o melhor a fazer é aguardar as ordens do Presidente. Paulo rompe a multidão e tapa a boca do sindicalista, olhando diretamente para o espectador e dizendo: “vocês estão vendo o que é o povo, um imbecil, um analfabeto, um despolitizado — já pensaram Jerônimo no poder?” Gláuber Rocha denunciava que quando não estavam reprimindo fisicamente o povo em nome do apoio aos reformistas, os ditos revolucionários o faziam silenciando a sua voz e rebaixando-o intelectualmente. Até que um maltrapilho interpretado por Flávio Migliaccio arrasta-se por entre a multidão, escala o braço de Paulo Martins e destapa a boca de Jerônimo. O cidadão pede um momento de atenção em meio à batucada; que para de tocar para ouvi-lo. Todos observam, menos Felipe Vieira que desvia o olhar. Então o cidadão diz: “Seu Jerônimo faz a política da gente, mas não é o povo, o povo sou eu que tenho sete filhos e não tenho onde morar.” O personagem é imediatamente escorraçado aos gritos de “radical” e “extremista”; sem nem ao menos termos a chance de saber seu nome. O povo de Gláuber Rocha, em suas diversas características, se revela nesta última cena. A prévia exposição, não só sobre populismo, mas também sobre nacionalismo e modernismo, se justificam a partir deste momento. Em que pese a modernização assistida no Brasil, a massa crítica brasileira continuava marginal; lumpen-proletários de um país subdesenvolvido, a periferia da periferia; essa é a verdadeira imagem do povo brasileiro que Terra em Transe revelava em choque até mesmo para os mais radicais revolucionários de seu tempo. A influência que a dita crítica ao “populismo” exerceu sobre outros artistas tropicalistas foi diversas vezes atribuída a esta cena. Longe de esgotar a questão, podemos ver como uma compreensão mais rigorosa sobre o populismo não dialoga de forma tão simples e direta com a leitura que feita do filme, nem das críticas realizadas pelos diversos “tropicalismos”. Portanto, na sequência desta leitura, o termo ‘populismo’ será preterido a conceitos políticos menos ambíguos; como oportunismo, demagógico e capitulação, a depender do caso. De modo que, por vezes, estaremos em diálogo com autores que fazem o uso do termo ‘populismo’ sem o mesmo cuidado; o que irá demandar pequenas correções e comentários a fim de “acertar os ponteiros”. Enfim, a exposição dos conceitos de nacionalismo, modernismo e populismo buscou compreendê-los enquanto fenômenos político-sociais, para em seguida analisarmos como suas influências se manifestaram na Tropicália; não só enquanto obra musical, mas também como fenômeno cultural. Agora parece o momento apropriado para entender que fenômeno cultural é este.
1.4 Tropicalismo
O termo ‘tropicalismo’ também possui sentidos ambíguos e usos precedendo em muito os eventos da década de 1960 no Brasil. A título de curiosidade, a referência mais antiga ao termo encontrado na Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional (ainda no século XX) remete a uma coluna do jornal O Estado de Florianópolis, de 1918 (92). Em Casa-Grande e Senzala, Gilberto Freyre faz largo uso do termo ‘luso-tropicalismo’. Até mesmo Gilberto Gil conta em diversas entrevistas que seu pai clamava para si o título de verdadeiro tropicalista; afinal, era um médico especialista em doenças tropicais. Diferentemente do uso sem critério do termo ‘populismo’, o ‘tropicalismo’ empregado por inúmeros autores não prejudica o entendimento da narrativa sobre o fenômeno cultural. Em todo caso, julgo que o termo carrega um sentido que excede as inspirações deste trabalho. O que se entende por tropicalismo começa a surgir em 1967. Neste ano, quatro obras de diferentes mídias foram apresentadas ao público para nunca mais serem esquecidas. São elas: o já citado Terra em Transe de Gláuber Rocha; a montagem da peça O Rei da Vela, de Zé Celso Martinez; a exposição Nova Figuração Brasileira, onde Hélio Oiticica apresenta o penetrável Tropicália; e as músicas Tropicália e Alegria, Alegria de Caetano Veloso, apresentada no III Festival da Música Popular Brasileira. Além destes, os irmãos Haroldo e Augusto de Campos fizeram da poesia concreta um posto avançado da vanguarda estética nacional durante os anos 1950. Após os concretistas, a literatura teve sua “evolução tropicalista” expressa na figura de José Agrippino de Paula e seu livro Panamérica (1967). Torna-se uma evidência empírica que a cultura brasileira foi tomada de assalto no ano de 1967. Pairava no ar a sensação de que, mesmo sob um regime ditatorial, a genialidade da arte brasileira seguiria seu curso. Esta sensação, contudo, se provou falsa. Não obstante, aquele final de década de 1960 mostrou a possibilidade de a cultura brasileira ser autenticamente nacional e originalmente moderna.
A modernidade se justificava nas novas linguagens, introduzidas pelos artistas e mediadas pelas novas tecnologias disponíveis. Os meios de comunicação influenciaram a percepção dos artistas e expandiram suas mentes quanto às possibilidades estéticas e o comportamento geral da sociedade. A obra Adoração (1966) de Nelson Leirner apresenta um painel-altar, sua borda esta repleta de fotos de santos; ao centro, um retrato do cantor Roberto Carlos contornado por luzes neon. Adoração sintetiza o estado da modernidade brasileira no elemento tecnológico (neon), o fervor religioso (os santos) e o poder dos meios de comunicação em criar mitos (Roberto Carlos). Outras obras, como Os Super-Homens (1965) e Policiais Identificados na Chacina (1968) de Rubens Gerchman, dialogavam com a linguagem e a estética cotidianas do povo brasileiro. No teatro, O Rei da Vela trazia a crítica à classe média e a antropofagia de Oswald de Andrade para o Brasil pós-1964. E na música, como veremos adiante, elementos tradicionais do folclore brasileiro, como o berimbau, se uniriam não só à guitarra elétrica, como ao que na época chamava-se “música eletrônica”. Essa nova expressão da modernidade nacional é o que convencionou-se por tropicalismo. Mas nem os próprios artistas sentiam-se confortáveis com este termo.
Ainda sob o impacto da bomba criativa que fora o ano anterior, Nelson Motta publicou em 5 de fevereiro de 1968, no jornal Última Hora, a icônica coluna intitulada A Cruzada Tropicalista (93). A partir deste texto, toda aquela força criativa era reduzida ao termo tropicalismo. Diz Pedro Duarte (2018):
“Caetano foi reticente, e Gil ficou desconfiado. Hélio foi quem atacou diretamente. Torquato adotou tom cético, apostando que essa moda não pegaria (…) Entretanto, assim como nenhum de nós escolhe como será chamado pois são os outros que nos nomeiam, também com esses artistas foi assim (…) Tropicalismo estava consagrado” (94).
Em março de 1968 o tropicalismo é tema diário do Caderno B do Jornal do Brasil. É alvo de comparações; muitas delas pouco simpáticas e até mesmo injustas e incompreensíveis. É usado como adjetivo para roupas, restaurantes, debatido nos cadernos culturais e até a estética poynette (95) é descrita como ‘tropicalismo francês’ para simplificar seu entendimento. Mas nem tudo são flores nos trópicos: enquanto estética, os tropicalistas enfrentavam resistências e estranhamentos entre pares, público e crítica; veremos mais sobre isso nos próximos capítulos. Enquanto termo, o tropicalismo também era empregado negativamente; fosse como adjetivo para as obras públicas sem sentido (96), ou para a contrapor a “rigorosa disciplina marxista” com “tropicalismo indolente” dos latino-americanos em Cuba (97). Assim como ‘bossa’ virara o termo da moda no início dos anos 1960, adjetivando até mesmo o presidente, o tropicalismo era o rótulo que o marketing buscaria para “agregar valor” naquele final de década. Com exceção que, diferente da Bossa Nova, o tropicalismo precedia a própria obra tropicalista. Tropicália ou Panis et Circensis (1968) só seria lançado em junho, ao passo que esses debates já eram cotidianos na imprensa em meados de março. “Os jornalistas e os publicitários já não podem negar a existência do tropicalismo” (98) , dizia José Carlos Oliveira, defensor de primeira hora da Tropicália. Na coluna O Tropicalismo contra os hipócritas, Oliveira recomendava às redações não mais gastar com reportagens internacionais sobre a psicodelia europeia ou os hippies de Nova York. “Podem deixar de mandar dinheiro para fora se passarem a comprar outro produto igualmente interessante e que tem a vantagem de ser fabricado no Brasil. Chama-se tropicalismo”. O jornalista identificou duas questões muito importantes para a compreensão do que estava se desenrolando diante de seus olhos. Primeira, há de fato alguma similaridade entre a estética tropicalista e a psicodelia europeia. Ambas exploram a ideia da liberdade natural, expressa nas flores, nas plantas e nos cabelos longos e soltos. E ao passo que a imagem tropicalista se apoiava no modernismo antropofágico, a psicodelia inglesa foi buscar inspiração no art nouveau. Mas essas semelhanças param por aí; a forma tropicalista de encarar a realidade é muito menos ingênua do que a da psicodelia europeia ou mesmo os hippies estadunidenses. Por hora, o importante é perceber que apesar das diferenças, essas três vertentes estéticas dialogam com as especificidades modernas de seus respectivos lugares no mundo. Percebendo isso, Oliveira atenta à segunda questão: porque a mídia deveria se importar com o que acontece fora, quando há algo totalmente nosso acontecendo bem debaixo dos seus narizes? Note-se que o jornalista referiu-se à moda. Logo no início do texto, José Carlos de Oliveira deixa claro estar se referindo ao tropicalismo e não à Tropicália; “porque esta última palavra, graças ao talento e à fama de Caetano Veloso, corre o risco de circunscrever um tema nacional ao domínio exclusivo da música popular”. Pois esta é precisamente a distinção que nossa leitura aspira realizar: por tropicalismo, entenderemos a repercussão e os desdobramentos midiáticos; e por Tropicália, a obra musical produzida por Caetano Veloso, Gilberto Gil, Rogério Duprat, Tom Zé, Gal Costa, Torquato Neto, José Carlos Capinam, Arnaldo Baptista, Rita Lee e Sérgio Dias. Em que pese a analise sobre o debate cultural do final dos anos 1960, o termo “tropicalismo” mais confunde do que explica. A cobertura sensacionalista da nova moda criou ruídos entre os artistas e a crítica. Muito do que se criticou sobre a Tropicália à época, deveu-se a interpretações enviesadas pelos meios de comunicação, e exacerbadas pelo conturbado momento político em que viviam aquelas pessoas. Para nós, o tropicalismo carrega em si um importante componente para o debate sobre a modernidade cultural. Contudo, este surge como consequência da obra idealizada pelos músicos tropicalistas. De tal maneira que o tropicalismo, enquanto moda, não reflete a visão dos autores sobre a modernidade nacional, mas da modernidade nacional sobre eles. É uma relação na qual os artistas possuem um papel passivo. Apesar de abrir questões muito importantes, por hora nos limitaremos a observar a forma ativa pela qual a Tropicália e suas novas concepções artísticas influíram na cultura e na visão de um Brasil moderno.
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[COMO CITAR: CARNEIRO, André Luis. Tropicália — Bananas ao vento: a música tropicalista como retrato de uma modernidade interrompida. 146 p. 2021. Monografia (Graduação em História) — Departamento de História. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2021.]
Links para os outros capítulos:
[Introdução]
[Capítulo 2: Vandrés e Vanguardas: O Estado da MPB (1930–1967)]
[Capítulo 3: Violência, Viola, Violeiro: O Surgimento Da Tropicália]
[Capítulo 4: A Rota do Ano Luz: Análise das Músicas]
[Capítulo 5 — Dos Braços De 2000 Mil Anos: Considerações Finais]
Notas:
- Pesquisa publicada em Julho de 2019 (Último acesso 06/04/2020) http://media.folha.uol.com.br/datafolha/2019/07/08/9e346cb3192dbc15d6f2d8368557c318idc.pdf
- Ibid. p. 13 e p. 14
- HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro-11. ed. -Rio de Janeiro: DP&A, 2006.
- HOBSBAWM, Eric. A Era do capital, 1848–1875–27o ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2017 p.141
- Ibid. p. 143
- Ibid. p.141
- Ibid. p. 149
- ACTON, John Dalber: Nacionalidade (1862) — Um Mapa da Questão Nacional (Org. Gopal Balakrishnan, 2000. p.25
- Ibid. p. 27
- Ibid. p. 28
- CHATTERJEE, Partha. Comunidade imaginada por quem? In: Balakrishnan, G. Um mapa da questão nacional. Rio de Janeiro — Ed. Contraponto, p. 227, 2000
- Ibid. p. 228
- Ibid. p. 229
- Ibid. p. 230
- O que não significa, de forma alguma, dizer que os povos nativos brasileiros não possuem História ou memória
- RIBEIRO, Darcy: O Povo Brasileiro: A formação e o sentido do Brasil. Companhia das Letras, 1995 p.128
- Ibid. p. 83
- Ibid. p. 91
- “Uma cultura feita de retalhos do que o africano guardara no peito nos longos anos de escravidão, como sentimentos musicais, ritmos, sabores e religiosidade. A partir dessas precárias bases, o negro urbano veio a ser o que há de mais vigoroso e belo na cultura popular brasileira. Com base nela é que se estrutura o nosso Carnaval (…) o negro aproveita cada oportunidade que lhe é dada para expressar o seu valor. Isso ocorre em todos os campos em que não se exige escolaridade. É o caso da música popular, do futebol e de numerosas formas menos visíveis de competição e de expressão” (Ibid, p. 168)
- Ibid. p. 170 e p. 171
- Ibid. p. 181
- Ibid. p. 332
- Ibid. p. 190
- Ibid. p. 188
- SAFATLE, Vladimir Pinheiro. O fim da música. Folha de S.Paulo. Ilustrada, São Paulo, p. 9 out. 2015. p. 12
- Ibid
- A categoria “universitária” para a atual produção fonográfica de estilo sertanejo é digna de um debate mais aprofundado. Por hora, limito-me a dizer que, diante do estágio primário de consciência política e a adesão fervorosa do corpo discente aos produtos da indústria cultural, o termo parece adequado.
- FANON, Frantz. Os Condenados da Terra: 2o. ed. — Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,1979 p. 196
- Ibid. p. 171
- Ibid. p. 172
- Ibid. p. 173
- Ibid. p. 181
- Ibid. p. 183
- Ibid. p. 185
- Ibid. p. 185
- Ibid. p. 186
- Ibid. p. 188
- Ibid. p. 193
- Ibid. p. 194
- SAFATLE. op.cit
- Arquivo Nacional, BR_DFANBSB_N8_0_PRO_CSS_0313_D0001DE0001
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- Ibid. p. 355
- Ibidi. p. 356
- Ibid. p. 371
- Ibid. p. 372
- HUYSSEN, Andreas. Memórias do modernismo. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1996
- VELLOSO, op.cit. p. 362
- Ibid. p. 376
- Ibid. p. 379
- Ibid. p. 380
- Ibid. p. 382
- Reforçando, mais uma vez, que Mário de Andrade se insere em um contexto de modernização, enquanto Fanon, em um contexto de Revolução.
- Ibid. p. 377
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- Ibid. p. 193
- Ibid. p. 193.
- Ibid. p. 193 e p. 194
- Ibid.
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- Ibid.
- Ibid. p. 11
- Ibid. p. 5
- Ibid. p. 8
- Ibid.
- CANNONE, Hélio. O nacional-desenvolvimentismo como ideologia no ISEB. In. IV Semana discente do Instituto de Estudos Sociais e Políticos. 2018, Rio de Janeiro, Anais. Rio de Janeiro: IESP-UERJ, 2018
- Ibid. p. 331
- Ibid. p. 334
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- CANNONE, op.cit. p. 340
- Ibid p. 344
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- FERRERAS op.cit p. 214
- Ibid. p. 221
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- Ibid. p. 167
- Ibid
- Ibid p. 167
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